A responsabilidade dos membros dos órgãos sociais das
pessoas colectivas por dívidas ao fisco
Regina de Almeida Monteiro
Porto, Julho de 2013.
ÍNDICE
1. A
personalidade tributária das pessoas colectivas........................................................ 3
2- Os responsáveis tributários e o conceito de
sujeito passivo........................................ 5
3. Fundamento da
Responsabilidade Tributária................................................................ 8
4 – Regime Jurídico da
responsabilidade tributária dos membros dos corpos sociais das pessoas
colectivas. 10
5. Despacho de reversão.................................................................................................. 12
6. Fundamentação da
responsabilidade subsidiária tributária dos membros do Conselho Fiscal e dos
ROC’s 13
7. Fundamentação da
responsabilidade subsidiária dos TOC’s...................................... 15
8. Responsabilidade tributária
por dívidas de impostos, à Segurança Social e coimas.... 15
8.1. Dívidas de impostos......................................................................................... 15
8.2. Dividas por coimas........................................................................................... 16
9. A aplicação da lei no tempo........................................................................................ 19
10. Aplicação no tempo do
regime da responsabilidade tributária.................................. 20
10.1. Pessoas abrangidas:........................................................................................ 21
CONCLUSÕES............................................................................................................... 23
1.
A personalidade tributária das pessoas colectivas
As pessoas Colectivas são
titulares autónomas de personalidade jurídica. De acordo com o art. 158 Código
Civil, gozam de personalidade jurídica. Têm capacidade de gozo e de exercício
de direitos, o que abrange todos os direitos e obrigações acessórias ou
convenientes à prossecução dos seus fins, como dispõe o art. 160 do Código
Civil.
O Direito Tributário reconhece às pessoas colectivas personalidade
jurídica tributária, na medida em que os
coloca na posição de sujeitos passivos de relações jurídicas tributárias. È o
caso, do art. 2 nº. 1 CIRC que considera sujeitos passivos de IRC “As
sociedades comerciais civis sob a forma comercial, as cooperativas, as empresas
públicas e as demais pessoas colectivas de direito público ou privado com sede
ou direcção efectiva em território português”.
As pessoas colectivas exercem os direitos e deveres que lhes pertencem
através dos seus órgãos, pessoas singulares que actuam em nome da sociedade
praticando os actos e negócios jurídicos cujos efeitos, se produzem na esfera
jurídica destas. Os administradores, directores e gerentes das sociedades, agem
em nome da sociedade, obrigam a sociedade perante terceiros e cumprem as suas
obrigações, praticando todos os actos necessários ao funcionamento normal da
pessoa colectiva como sujeito de direitos.
No caso dos impostos, a lei impõe aos sujeitos passivos diversos deveres,
além de pagar o imposto devido. Trata-se de deveres acessórios da obrigação
tributária, isto é, outras obrigações como a de declaração de início de
actividade, declaração periódica de rendimentos, prestar outras informações,
obrigações dispersas pelos diversos códigos tributários.
Podemos concluir que, as pessoas
colectivas são assim os entes jurídicos dotados de personalidade jurídica
própria e que no âmbito dela se inclui a personalidade e capacidade tributária
passiva. É o seu património que suporta o pagamento dos impostos e coimas
resultantes de infracções tributárias a que elas estão sujeitas.
É aos administradores, directores e gerentes que compete em representação
da sociedade proceder à efectivação do cumprimento da prestação principal da
obrigação tributária e dos deveres acessórios referidos. Cumprem estes deveres
tributários no cumprimento das suas funções e à custa do património da pessoa
colectiva.
Os membros dos órgãos sociais das sociedades têm de, em nome da sociedade
e à custa do património desta, realizar os actos materiais para cumprimento
dessa prestação.
De mencionar ainda que as leis tributárias, não se referem unicamente às
sociedades comerciais, enquanto sujeitos de impostos, mas também aos outros
tipos de pessoas colectivas de direito privado, as associações e fundações, e
pessoas colectivas de direito público, caso de entidades empresariais do
Estado.
2- Os responsáveis tributários e o conceito de
sujeito passivo
O art. 18 n.º 3 LGT dispõe que “o sujeito passivo é a pessoa singular ou
colectiva, o património ou a organização de factos ou de direitos que nos
termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como
contribuinte directo, substituto ou responsável”.
No n.º 4, este artigo, exclui do conceito de sujeito passivo na alínea a)
“ quem suporta o encargo do imposto por repercussão legal…”, e na alínea b)
quem “ deva prestar informações sobre assuntos tributários de terceiros, exibir
documentos….”.
Encontramos aqui conceitos que exigem que mencionamos a sua configuração legal
antes de prosseguir na análise do tema “do regime da responsabilidade dos
membros dos órgãos das pessoas colectivas pelas dívidas ao Fisco”.
Conceito de contribuinte – O contribuinte é a pessoa física ou jurídica a
quem a lei impõe o suporte económico para o pagamento da divida de imposto
derivado da ocorrência do facto tributário.
Conceito de sujeito passivo – A pessoa singular ou colectiva que segundo
a lei fica obrigado ao cumprimento das prestações tributárias.
O sujeito
passivo é o obrigado ao cumprimento da obrigação tributária, seja como
contribuinte directo substituto ou responsável.
Conceito de substituto - Na substituição tributária aquele que substitui o
contribuinte, é o sujeito passivo que por imposição da lei e em lugar daquele
fica obrigado a cumprir prestações materiais e formas de obrigação tributária.
É o que acontece
com as entidades patronais no IRS, que ficam obrigadas à retenção na fonte do
imposto devido pelos seus trabalhadores e entregá-los ao Estado.
Conceito de responsável Tributário – O
responsável tributário, é um terceiro que se coloca ao lado do sujeito passivo
do imposto, que se junta a ele como devedor, que em caso da Administração
Tributária, após provar a inexistência de património do sujeito passivo
originário, não dispor de património suficiente para pagar a dívida tributária,
elabora o despacho de reversão tributária, notificando-o ao responsável, para
que pague a dívida tributária com o seu património.
Natureza e fundamento da responsabilidade tributária. Atendendo ao
conceito de responsável tributário mencionado, impõe-se agora que, dedicamos a
nossa atenção a determinar a natureza jurídica da responsabilidade tributaria e
encontrar uma resposta para a questão de saber se tal como menciona o art. 18
nº. 3 LGT, o responsável tributário é um sujeito passivo em sentido próprio.
Da análise do art. 24 LGT, uma das características da instituição da
responsabilidade tributária, é que, se trata de um terceiro que por imposição
legal, se coloca ao lado do sujeito passivo do imposto, e que, se junta a ele
para responder pela dívida tributária, porém sem retirar a este nem alterar a
sua posição de obrigado. Assim, o facto tributário ocorreu em relação à pessoa
colectiva, foi esta que manifestou a capacidade tributária que determina a
constituição da relação tributária. O responsável não é o sujeito dessa relação
jurídica, e apenas fica obrigado ao pagamento das prestações pecuniárias, e não
recai sobre ele qualquer outro dever acessório, que normalmente acompanha a
relação jurídica tributária.
Outra nota importante é a de que o responsável tributário apenas assume
essa posição de devedor através de disposição legal. É o legislador que
determina os pressupostos de facto, que uma vez verificados, determinam que
assumam essa posição subjectiva em relação tributária.
A responsabilidade tributária dos membros dos órgãos das pessoas
colectivas, está configurado como responsabilidade subsidiária, é defensável do
ponto de vista teórico, que o legislador pretende com este instituto assegurar
o crédito do sujeito activo da relação tributária. Neste sentido, Joaquim
Freitas da Rocha, Lições de Procedimento e Processo Tributário, Coimbra
Editora, Coimbra 2004, pág. 246. Ele é o garante pessoal da prestação
tributária por imposição da lei, Joaquim Freitas Rocha, considera que “a
responsabilidade tributária configura-se como uma garantia pessoal sob a forma
de fiança legal”. O responsável subsidiário é uma garantia da obrigação
tributária constante da execução fiscal, como afirma o acórdão do STA de
12-2-1997, proferido do recurso nº. 2300, in www. dgsi.pt.
Concluímos que o responsável tributário não ocupa uma posição idêntica à
do sujeito passivo na relação jurídica tributária. O responsável tributário
assume essa posição de obrigado, como um elemento pessoal adicionado em função
de garantia do imposto, como um fiador pessoal. Em relação a ele não se
verificou o facto tributário mas a realização de um facto previsto na lei, que
determina que tenha de assumir uma dívida tributária de outrem.
A sua posição é de por imposição legal garantir a cobrança da divida
tributária de outrem e só o faz de forma subsidiaria, isto é, após a prova da
inexistência ou insuficiência do património do sujeito passivo originário.
3. Fundamento
da Responsabilidade Tributária
Analisando a doutrina e, Acórdãos do STA que analisam esta questão, é
nossa convicção que o fundamento da responsabilidade tributaria é ditada por
razões de eficácia na cobrança das dividas tributarias. O legislador atribui o
dever de pagar o imposto a pessoas, que não têm qualquer relação directa com a
divida tributaria do sujeito passivo, para tornar efectiva a cobrança da
divida.
Estes terceiros, no caso dos membros dos corpos sociais das pessoas
colectivas, em especial as das sociedades comerciais são escolhidos pelo
legislador com base numa relação privilegiada com a sociedade. Estão numa
posição que lhes permite influenciar e determinar o cumprimento das obrigações
tributárias. Os administradores, gerentes, directores, membros dos órgãos de fiscalização,
revisores oficiais de contas e técnicos de contas (art. 24 da LGT), exercem
funções, e é por esses facto que se justifica que lhes seja exigida as dívidas
tributárias da sociedade.
De referir que a lei exige para a concretização da responsabilidade
tributária deste membros dos corpos gerentes, que tenham exercido de facto as
funções, não basta o exercício apenas de direito, recaindo sobre o responsável
tributário a prova do efectivo exercício de funções.
E porquê exigir aos membros dos corpos sociais das pessoas colectivas o
pagamento das dívidas fiscais da sociedade?
O art. 64 CSC, determina expressamente que “os gerentes, administradores
ou directores de uma sociedade, devem actuar com as diligências de um gestor
criterioso e ordenado, no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses
dos sócios e dos seus trabalhadores”.
È um dever legal que impõem aos gestores um especial cuidado das
obrigações tributarias, nomeadamente o pagamento dos impostos nos prazos
legais.
Relativamente
aos membros dos órgãos de fiscalização (Conselho Fiscal e ROC’s), é o
incumprimento das suas funções de fiscalização que justifica que sejam
responsáveis das dívidas da sociedade (art. 24 n.º 2 da LGT).
Os Técnicos Oficiais de Contas, também serão responsáveis tributários
pelas dividas das pessoas colectivas, em caso de violação dolosa dos deveres de
assunção de responsabilidade nas áreas contabilísticas e fiscais ou de
assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos
(art. 24, nº 3 LGT)
4 – Regime Jurídico da responsabilidade
tributária dos membros dos corpos sociais das pessoas colectivas.
A responsabilidade é subsidiária perante a pessoa
colectiva e solidária entre os responsáveis.
O art. 22, n.º 3 da LGT dispõe que “ a responsabilidade
tributária por dívidas de outrem é, salvo determinação em contrário,
subsidiária.
Na responsabilidade subsidiária, o Administração Tributária apenas pode
acionar o devedor subsidiário, após a reversão no processo de execução fiscal,
isto é, após no processo de reversão fiscal instaurado contra o devedor
originário e se ter provado que o mesmo não tem bens suficientes para proceder
ao pagamento da dívida objecto de execução. Até notificação desse acto ao
responsável tributário não pode ser pedido pagamento da dívida fiscal. A
reversão é um acto administrativo tributário, de competência do Chefe de
Repartição de Finanças onde corre o processo de execução fiscal contra o
devedor originário, a sociedade comercial, e que uma vez confirmada a
inexistência ou insuficiência de bens deste para o pagamento das dívidas
tributárias, determina que os responsáveis tributários subsidiários, sejam
chamados ao processo de execução, para que se possa prosseguir a execução
contra eles e assim garantir a cobrança da dívida. Na execução fiscal
instaurada contra o devedor originário deverá ser averiguado pela Administração
Tributária a existência de bens penhoráveis do devedor originário e dos seus
sucessores.
Uma vez apurada essa insuficiência, a Administração
Tributária terá de solicitar à Conservatória do Registo Comercial da área da
sede do devedor originário a identificação do responsáveis subsidiários, o que
deverá constar das certidões emitidas.
Na posse destes dados, o Chefe da Repartição de Finanças,
mandará então citar os potenciais responsáveis, para a realização de audiência
prévia (arts. 23, n.º4 e 60 LGT e 45 CPPT).
O art.23 n.º 2 LGT, consagra o beneficio da excussão
prévia o qual significa que antes de revertida a execução, contra os
responsáveis subsidiários devem ter sido penhorados e vendidos os bens do
devedor principal e dos responsáveis solidários. Mas, temos de atender ao
disposto no art. 23 n.º3 LGT, que prevê a possibilidade da reversão da execução
fiscal contra o responsável subsidiário poder ser decida antes de ser excutidos
os bens da pessoa colectiva. Neste caso “o processo de execução fiscal fica
suspenso desde o termo do prazo da oposição, até à completa excussão do
património do executado sem prejuízo da adopção de medidas cautelares adequadas
nos termos da lei” (art. 23 n.º 3 LGT).
Assim podem ser penhorados os bens do responsável tributário mas não pode
prosseguir o processo[1].
De referir que o processo de execução fiscal nos termos do art. 103, n.º
1 LGT “tem natureza judicial sem prejuízo de intervenção dos órgãos da
administração tributária, nos actos que não tenham natureza jurisdicional”.
5. Despacho de reversão
O despacho de reversão deve ser emitido pelo Chefe de Repartição de
Finanças, competente, mesmo que o processo de execução decorra no Tribunal
Administrativo e Fiscal, caso em que entendemos que esse despacho deverá ser
homologado pelo juiz, e só depois se procederá à audiência prévia., (arts. 247,
143 e 160, 217 a 236 CPPT).
A reversão apesar de se verificar no processo de execução fiscal é um
acto administrativo tributário, daí que se imponha a audiência, dos potenciais
devedores subsidiários, assim como a fundamentação dos pressupostos que devem
constar da citação. O direito de audiência é um das garantias dos administrados
no Código de Procedimento Administrativo, art. 100.
Efectivada a responsabilidade subsidiária, mediante a citação pessoal,
nos termos do art. 233 do Código de Processo Civil e 192, n.º 1 do CPPT, isto
é, citação através de contacto directo do funcionário da Administração
Tributária, ou através de citação postal.
O responsável mediante o direito de audiência prévia assume uma
participação activa na formação da decisão da reversão. De acordo com o art.
60, n.º 7 LGT “todos os elementos novos suscitados na audiência prévia dos
contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão”.
Com a audiência prévia, podem os potenciais responsáveis evitar ser
executados, desde que provem que a sociedade tem bens suficientes para pagar as
dívidas em execução ou que não se verificam em relação a eles os pressupostos
para serem constituídos executados por reversão.
O despacho de reversão deve ser fundamentado, cumprindo com o disposto no
art. 77 LGT, n.º 2. Esta deve consistir na exposição dos fundamentos de facto e
de direito que motivaram a decisão, ou numa declaração de concordância com os
fundamentos de anteriores pareceres, ou seja, fundamentação da inexistência ou
insuficiência do património da sociedade executada, o que contudo a
Administração tributária, omite muitas vezes.
6. Fundamentação
da responsabilidade subsidiária tributária dos membros do Conselho Fiscal e dos
ROC’s
Os órgãos de fiscalização das
pessoas colectivas podem ser o Conselho Fiscal nas sociedades anónimas e por
quotas. O art. 413 CSC, dispõe que a fiscalização da sociedade compete a um
fiscal único que deve ser um ROC ou uma SROC. O conselho fiscal, o que também é
válido para as sociedades anónimas, quer as sociedades por quotas por quotas,
(remissão do art. 262 CSC).
São funções do
fiscal único ou do conselho fiscal, art. 420 CSC fiscalizar a administração da
sociedade, vigiar a observância da lei e do contrato de sociedade, verificar a
regularidade dos livros, registos contabilísticos e documentos que lhe servem
de suporte, verificar a exactidão do balanço e demonstração de resultados,
elaborar anualmente relatório sobre a sua acção fiscalizadora e dar parecer
sobre o relatório contas e propostas apresentadas pela administração.
O art. 420 n.º 2, CSC permite a
qualquer membro do conselho fiscal proceder a todos os actos de verificação e
inspecção que considerem necessários no cumprimento da sua acção fiscalizadora.
O art. 420, n.º 3 CSC, estabelece o dever dos membros do conselho fiscal e do
ROC, procederem a todos os exames e verificações necessárias à revisão e
certificação legal das contas.
O ROC tem assim vários deveres
estabelecidos legalmente relativos às sociedades de responsabilidade limitada,
devendo elaborar, planear e executar o seu exame e ao avaliar e relatar as
conclusões tendo em conta as situações de incumprimento pela sociedade das leis
e regulamentos vigentes que possam afectar as demonstrações financeiras. O ROC
deverá exercer as suas funções com a diligência exigida ao exercício das suas
funções e daí que não possa ser responsabilizado pelo incumprimento intencional
ou não, por parte da sociedade dos seus deveres fiscais. È necessário para que
tenha culpa e possa ser considerado
responsável tributário que, exista prova de que teve conhecimento ou participou
ou não seguiu os procedimento que lhe são impostos e adequados às
circunstâncias.
A efectivação da reversão fiscal sobre o ROC baseia-se na existência de
culpa presumida no art. 24 LGT, culpa que pode ser por dolo ou negligência[2].
A prova da culpa dos ROC’s, de acordo com o art. 74 LGT e 342 Código
Civil, caberá a Administração Tributária, a qual terá de demonstrar a
existência de culpa do ROC, no incumprimento dos deveres de fiscalização a que
está obrigado. Também não podemos esquecer que acresce a prova do nexo de
causalidade entre o incumprimento das funções de fiscalização que lhe compete e
a violação dos deveres tributários da sociedade.
Entendemos que a responsabilização dos ROC’s deverá ser objecto de uma
aplicação rigorosa.
A pergunta que nos colocamos, é se é razoável a manutenção deste regime
subsidiário de responsabilidade pelas dívidas da sociedade?
7. Fundamentação
da responsabilidade subsidiária dos TOC’s
O art. 24, n.º 3 LGT, estende a responsabilidade pelas dívidas da
sociedade aos Técnicos Oficiais de Contas no caso de violação dos deveres de
assunção da responsabilidade pela regularização técnica nas áreas
contabilísticas e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações
financeiras e seus anexos.
A Administração Tributária não especifica o que entende por regularização
técnica nas áreas contabilísticas e fiscal. Presume a Administração Tributária
a existência de negligência ou mera culpa, do TOC, por violação do dever de
diligência que nos termos dos Estatutos dos TOC’s exige que este actue com a
diligência de um profissional adstrito a determinadas funções e deveres
específicos da sua profissão. O comportamento exigido a um TOC para que não
seja considerado negligente é que actue como um profissional médio, razoável,
atento, qualificado e empenhado no exercício da sua actividade. É também
exigível que conheça os deveres que lhe são imputados na assunção de
responsabilidade pela regularização técnica mencionada. Ser TOC face ao art.
24, n.º 3 LGT, representa um considerável risco do exercício da sua actividade,
pelo que a deverão exercer com o máximo rigor, ética e isenção.
8. Responsabilidade
tributária por dívidas de impostos, à Segurança Social e coimas
8.1. Dívidas de impostos
A responsabilidade dos administradores, directores e gerentes das
sociedades comerciais assenta de acordo com o art. 24 LGT, na verificação de
vários factos.
O primeiro facto relevante é o
exercício dessas funções ainda que somente de facto fundamentada numa culpa
subjectiva e presumida. È preciso atender ao exercício da gerência real ou de
facto e o período da ocorrência dos factos geradores da dívida tributária.
São abrangidas as dívidas cujo
facto constitutivo se tenha verificado no período do exercício do seu cargo e
as dívidas cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no
exercício do seu mandato.
Sendo as taxas, um tributo,
estas não são abrangidas pelo art. 24 LGT, uma vez que nas taxas normalmente a
contraprestação por parte da entidade pública depende do prévio pagamento do
valor da taxa, e caso esta não seja paga o serviço não é prestado.
8.2.
Dividas por coimas
O art. 3º, n.º 2 LGT
classifica os tributos, referindo que os tributos compreendem “os impostos,
incluindo os aduaneiros e especiais, e outras espécies criadas por lei,
designadamente as taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades
públicas.
Assim, as multas e coimas pela
infracção de obrigações tributárias estão excluídas do conceito de tributo.
Consequentemente não podem integrar-se no conceito de dívidas tributárias do
art. 22 e 24 LGT. Daí que as coimas e multas aplicadas ao devedor originário
não poderão por esta via ser exigidas ao responsável tributário.
Contudo, temos de
atender ao disposto no art. 8.º, n.º 1 do RGIT que estipula
a responsabilidade subsidiária dos administradores, gerentes e outras pessoas
que exerçam, ainda que apenas de facto, funções de administração em pessoas
colectivas, sociedades e outras entidades fiscalmente equiparadas pelas multas
ou coimas a estas aplicadas:
a) Por factos praticados no período de exercício do cargo
ou por factos anteriores, quando tenha sido por culpa sua que o património
social se tornou insuficiente para o pagamento;
b) Também por factos anteriores, quando a
decisão condenatória tenha sido notificada no período do exercício do cargo e
lhes seja imputável a falta de pagamento.
A responsabilidade civil dos administradores, gerentes e outras
pessoas que exerçam funções de administração em pessoas colectivas, sociedades
e outras entidades fiscalmente equiparadas pelo pagamento das sanções
pecuniárias, isto é das multas e coimas, pode originar duas situações
distintas. A primeira, no caso de os administradores ou gerentes não terem
colaborado dolosamente na prática da infracção fiscal; a segunda, no caso de
essa colaboração dolosa ter ocorrido.
Assim, no primeiro caso, o
n.º 1 do artigo 8.º do Regime Geral das Infracções Tributárias
Não se presume a culpa dos administradores ou gerentes na
insuficiência do património ou na falta de pagamento, ao contrário do que
acontecia na solução anterior, constante do que era o artigo 112.º, n.º 1,
alínea b), da Lei Geral Tributária, revogado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de
Junho em que se estabelecia a presunção de culpa na segunda das situações, isto
é, a presunção de culpa na falta de pagamento.
Por outro lado, na segunda hipótese, quando o administrador ou gerente
colaborou dolosamente na prática da infracção fiscal, como se prescreve no n.º
6 do artigo 8.º da RGIT, há lugar a uma responsabilidade solidária tanto face
ao agente principal da infracção como entre os colaboradores. Esta é já uma
solução alicerçada na lei civil, uma vez que consubstancia a emanação do
princípio constante do artigo 497.º do Código Civil, relativo à
responsabilidade pelo dano em caso de pluralidade de responsáveis.
Mas face ao art. 30 CRP, a responsabilidade penal é insusceptível de
transmissão, o que coloca a questão de saber se os membros dos órgão sociais
das pessoas colectivas podem em sede de reversão ser obrigados ao pagamento de
coimas e multas aplicadas ao devedor originário, tal como determina o art. 8.º
RGIT.
Sobre esta matéria, temos de mencionar a jurisprudência recente do
STA, que vai no sentido dessa intransmissibilidade e da inconstitucionalidade o
art. 8.º do RGIT, ficando bem clara esta posição nos seguintes Acórdãos do
Supremo Tribunal de Justiça: Acórdão de 27 de Fevereiro de 2008, proferido no
Processo n.º 01057/07; Acórdão de 12 de Março de 2008, proferido no Processo
n.º 01053/07.[3]
Refere
o Acórdão de 6 de Março de 2008, proferido no Processo n.º 01056/07: “E, então, havemos de concordar que, em processo
de contra-ordenação fiscal, o gerente executado por reversão
não tem legitimidade para, por si, interpor recurso judicial da
decisão de aplicação de coima à sociedade executada originária.”
O
Acórdão de 27 de Fevereiro de 2008, proferido no Processo n.º 01053/07 refere:
“Por violação dos princípios da intransmissibilidade das penas (artigo 30.º,
n.º 3 da CRP) e da presunção de inocência (artigo 32.º, n.º 2 da CRP), enferma
de inconstitucionalidade material a previsão normativa constante do artigo 8.º
do RGTI, relativa à responsabilidade subsidiária pelo pagamento de coimas dos
administradores, gerentes ou outras pessoas que tenham exercido a administração
das pessoas colectivas extintas”.
O
Acórdão de 12 de Março de 2008, proferido no Processo n.º 01057/07, repete esta
mesma posição: “Por violação dos princípios da intransmissibilidade das penas
(artigo 30.º, n.º 3 da CRP) e da presunção de inocência (artigo 32.º, n.º 2 da CRP), enferma de
inconstitucionalidade material a previsão normativa constante do artigo 8.º do RGTI, relativa à
responsabilidade subsidiária pelo pagamento de coimas dos
administradores, gerentes ou outras pessoas que tenham exercido a administração
das pessoas colectivas extintas”.
9. A aplicação da
lei no tempo
A Lei Geral Tributária entrou em
vigor em 1 de Janeiro de 1999, tendo o art. 24 sido alterado 2 vezes: Lei
30-G/2000, de 29 de Dezembro que entrou m vigor em de Janeiro de 2001; Lei n.º
60-A/2005, que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2006.
Inicialmente o art. 24 LGT, e que
vigorou até 1 de Janeiro de 2001, estabelecia a responsabilidade dos
administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que
somente de facto, funções de administração nas sociedades, cooperativas e
empresas públicas, são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e
solidariamente entre si, não estabelecendo no n.º 1 qualquer distinção sobre a
questão da culpa no facto de o património da sociedade se tornar insuficiente
para a satisfação das dívidas tributárias.
No n.º 2, referia que esta
responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos membros dos órgãos de
fiscalização e revisores oficiais de contas.
Com a Lei 30-G/2000, de 29 de
Dezembro a principal alteração refere-se à questão da culpa pelo não pagamento
das dívidas tributárias, e estendendo esta responsabilidade aos técnicos
oficiais de contas, através da introdução do n.º 3, em caso de violação dolosa
dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas
áreas contabilísticas e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais,
demonstrações financeiras e seus a anexos.
Com a alteração introduzida pela Lei n.º 60-A/2005, retira do n.º 3 do art.
24 a referência à culpa dolosa dos TOC’s, o que veio alargar o quadro legal da
responsabilidade tributária dos TOC’s.
Relativamente ao facto gerador da
responsabilidade e pressupostos da responsabilidade e respectivo ónus da prova,
desde a entrada em vigor da LGT manteve-se inalterado. Porém, na actual
redacção e desde a alteração da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro, desdobra a
anterior n.º 1, a) do art. 24 em duas alíneas. Assim, no n.º 1) refere:
a)
Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no
período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega
tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por
culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se
tornou insuficiente para a sua satisfação;
b)
Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha
terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes
foi imputável a falta de pagamento.
10. Aplicação no tempo do regime da
responsabilidade tributária
A regra é a de que o momento em que se verifica o facto
gerador da responsabilidade é que determina a norma a aplicar.
1. Se anterior a 01de Janeiro de 1999 – aplica-se o art 13
do CPT
2. Se posterior – aplica-se o art. 24 LGT
10.1. Pessoas abrangidas:
2.1.1- De 1 de Janeiro de 1999 a 1 de Janeiro de 2001
– As referidas na redacção inicial da LGT: administradores,
directores e gerentes, que exerçam, ainda que somente de facto, funções de
administração ou gestão em sociedades, cooperativas e empresas públicas.
- Membros dos órgãos de fiscalização e Revisores Oficiais
de Contas
2.1.2. De 1 de Janeiro de 2001 a 1 de Janeiro de 2006
- Administradores,
directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto,
funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente
equiparados.
- A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos
membros dos órgãos de fiscalização e revisores oficiais de contas nas pessoas
colectivas em que os houver,
- A
responsabilidade prevista neste artigo aplica-se também aos técnicos oficiais
de contas em caso de violação dolosa
dos deveres…
2.1.3. Após 1 de Janeiro de 2006
Administradores, directores e gerentes e outras pessoas que
exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em
pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados.
- A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos
membros dos órgãos de fiscalização e revisores oficiais de contas nas pessoas
colectivas em que os houver,
- A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos técnicos oficiais
de contas desde que se demonstre a violação dos deveres
De
referir que o art. 160, n.º 1 CPPT, refere:
Quando a execução reverta contra responsáveis subsidiários,
o órgão da execução fiscal mandá-los-á citar todos, depois de obtida informação
no processo sobre as quantias por que respondem.
Atendendo ao disposto no art. 153 CPPT[4]
deverão inicialmente chamados à reversão as pessoas mencionadas no n.º 1 do art.
24 LGT e só posteriormente os restantes[5].
CONCLUSÕES
- A
responsabilidade tributária dos administradores e gerentes das pessoas
colectivas é uma responsabilidade pelo pagamento de dívidas de outrem cujo
objectivo é garantir o cumprimento da obrigação tributária
- A prova da culpa dos ROC’s, de acordo com o art. 74
LGT e 342 Código Civil, caberá a Administração Tributária, a qual terá de
demonstrar a existência de culpa do ROC, no incumprimento dos deveres de
fiscalização a que está obrigado. Também não podemos esquecer que acresce
a prova do nexo de causalidade entre o incumprimento das funções de
fiscalização que lhe compete e a violação dos deveres tributários da
sociedade.
- Entendemos que a responsabilização dos ROC’s deverá
ser objecto de uma aplicação rigorosa.
- A pergunta que nos colocamos, é se é razoável a
manutenção deste regime subsidiário de responsabilidade pelas dívidas da
sociedade?
- Ser TOC face ao art. 24, n.º 3 LGT, representa um
considerável risco do exercício da sua actividade, pelo que a deverão
exercer com o máximo rigor, ética e isenção.
[1]Neste sentido, Acórdão do STA de 12.02.1997, proferido
no Recurso 21 300, in www. dgsi.pt.
[3] In dgsi.pt.
[4] Art. 153 CPPT: Podem ser executados no processo de execução fiscal os
devedores originários e seus sucessores dos tributos e demais dívidas referidas
no artigo 148.º,
bem como os garantes que se tenham obrigado como principais pagadores, até ao
limite da garantia prestada. 2 - O chamamento à execução dos responsáveis
subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias:
a) Inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores;
[5] É este o entendimento da
Direcção Geral dos Impostos, manifestado no Ofício Circulado n.º 60 058, de
2008-04-17
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